terça-feira, 16 de maio de 2017

O manifesto-grito-poema "Respeita", de Ana Cañas, e a resistência feminista

Canção-poema-livro-manifesto. Hip grito hop rap feminista. Resistência mulheril. Vários poderiam ser os epítetos de "Respeita" (produção Instituto), novo single da cantora e compositora Ana Cañas sobre as dores da opressão de gênero e toda violência material/simbólica envolvida no exercício do poder patriarcal, como assédios (morais, sexuais), estupros e suas variantes.

O videoclipe, dirigido por Isadora Brant e João Wainer, lançado pouco depois da liberação da faixa nas principais plataformas digitais, contou com a presença de 86 convidadas atuantes nos movimentos sociais organizados de mulheres em âmbito político feminista e outras lutas sociais. Nas gravações, foi-lhes pedido que fechassem os olhos e recordassem episódios de agressões, abusos ou opressões passados. O vídeo mostra cada uma das reações captadas.

Sobre o single/videoclipe:

O movimento covarde está sacado há muito tempo. Macho acha que pode dizer o que quiser e fazer mulher de objeto, mas aqui não é bagunça. Macho constrange-se com nada, discernimento zero. Pudera, foi socializado a não ter qualquer. Para quê? Mulher é inferior, é subserviente... Nasceu para ser. Logo, se sair disto, haverá consequências. Ainda hoje, é-se morta por tais desvios e outros pontos fora da curva. Esta fala errada, brincadeira ou não, dói - não se espera de um parceiro de vida -, fere, isola, mata.

Silêncio forçado é grito de socorro. Como todo grito, faz barulho, mesmo o menor deles. Mesmo o menor ruída. Toda mulher pode ouvi-lo. E ouve. Silêncio não protege, diria a poeta negra e lésbica estadunidense Audre Lorde (1934-1992). Silêncio afoga. Sufoca, de tão focado em silenciar/negar/apagar uma existência em sua dignidade. Se estivemos "caladas" até agora, é porque tínhamos de, primeiro, sobreviver em corpo e alma.

O atual sistema só permite a sobrevida de quem lhe é engrenagem, nunca vida. Diremos agora e aos berros que se a dor provocada é minha, a culpa da violência sofrida não o é. Só uma sociedade doente e de gente muito cínica, obtusa, pode culpabilizar a vítima. Vítima, sim, e este papel não imobiliza.

Desrespeitadas, ignoradas, assediadas, exploradas, mutiladas, destratadas, reprimidas, exploradas e mortas: a nossa luz não se apaga. Ninguém nos cala. Tentaram, continuam tentando, e vimos resistindo. Resistiremos. A alguém que só existe lutando cabe a resistência.

Todo luto nunca é demais, mas há um limite a suportar. A voz que hoje grita quer o silêncio de enfim viver em paz. Queremos ver o depois deste caminho de dor, sangue e luta. Queremos reexisti-lo. Lutar cansa. Resistir também. Parem de nos matar. Se não for na paz, será na guerra, e na guerra só há um grito possível: RESPEITA, PORRA!

Participaram deste registro:

Aline Lata
Ana Kehl
Ana Lúcia
Andrea Ribeiro
Andréia Horta
Adelaide Tereza Teixeira
Beatriz Lemos
Cacique Márcia Djeramirim (aldeia Jaraguá)
Camila Eiroa
Carmen Silva
Carolina Franco
Caroline Bahiense
Cíntia Sanchez
Cris Garcia Falcão
Divina Cunha Pereira da Silva
Domênica Dias
Eliane Dias
Elis Menezes
Elza Soares
Fernanda Grigolin
Fernanda Gianesella
Flávia Martinelli
Flora Leite
Gildimar de Souza Silva
Jal Vieira
Jackie Brown
Jéssica Moreira
Jobana Morya
Joice Pontes
Joy Vicentini
Júlia Bisilliat
Júlia Lemmertz
Júlia Navarra
Juliana Azevedo
Juliana de Castro
Karina Buhr
Karla Girotto
Laylla Estanislau
Larissa Conforto
Laura Dauden
Laura Neiva
Laura Villar
Lídia Ramo
Lívia Sales
Manoellen Aline
Maria Aparecida Dias
Maria Inez Vieira
Maria Rita Kehl
Maria da Penha
Maria Vitória de Lima Sousa
Mariana Lima
Marina Marchesan
Mariclecia Silvas dos Santos
Mariela Pizarro
Marlene Bergamo
Martha Raquel Rodrigues
Maureen Bisilliat
Mel Lisboa
Michele Wharton
Monique Evelle
Nathália Dill
Naná Rizinni
Neon Cunha
Olívia Ferreira
Patricia Bergantin
Patricia Cañas
Paula Sacchetta
Pétala Lopes
Pilar Baptista
Preta Ferreira
Preta Rara
Rita Wainer
Roberta Martinelli
Sabrina Silvana de Almeida
Savana Reis
Sheila Santana de Carvalho
Silvana Medeiros
Sinhá
Sofia Franco de Araújo
Sophia Bisilliat
Sophie Charlotte
Taciana Barros
Vânia Medeiros
Vera Egito
Zélia Duncan


Foto: reprodução/capa do single "Respeita"
Arte: Mag Magrela


Nenhum comentário:

Postar um comentário